Bia Monteiro

Múltiplas esculturas de pedras de granito , inox polido, desenho, folha de ouro, papel artesanal e carvão. Dimensões variadas


Bia Monteiro 

Constelação 20122005 (2022) 

Pedras de granito e inox polido 

Dimensões variadas 

Desde a pré-história, os seres humanos fizeram instalações com pedras, dentre as quais as mais famosas são os dólmens (pedras dispostas verticalmente, muitas vezes suportando uma outra pedra plana). Embora existam muitos dólmens espalhados pela Europa Ocidental, pouco se sabe sobre quem os ergueu e com quais objetivos. Restos humanos encontrados perto de muitos deles levaram a uma teoria frequentemente citada de que são túmulos. Haveria, assim, a ideia de que os dólmens fariam referência à vida de seres humanos que existiram, mas que não se encontram mais entre nós. Eles seriam testemunhos do mais antigo encontro do homem com a morte, mas também de uma comemoração da vida. 

O mais famoso desses monumentos em pedra é certamente Stonehenge, localizado na região de Wiltshire, na Inglaterra. Trata-se de uma enorme construção megalítica considerada um dos monumentos mais misteriosos do mundo. Acredita-se que Stonehenge tenha sido erigido entre 3100 a.C e 2075 a.C. Recentemente, por causa da seca que atinge a Europa neste ano, houve um ressurgimento, na Espanha rural, de um círculo de pedras pré-histórico em uma represa cujo nível da água abaixou. Oficialmente conhecido como o dólmen de Guadalperal, mas apelidado de "Stonehenge espanhol", acredita-se que o círculo de dezenas de pedras megalíticas teria sido instalado por volta de 5000 a.C. 

O trabalho de Bia Monteiro, Constelação 20122005, certamente encontra-se numa comunidade com esses antigos monumentos em pedra, mas liga-se também a propostas artísticas mais contemporâneas, como a do movimento Mono-ha (traduzido literalmente como “escola das coisas”), surgido em Tóquio no fim dos anos 1960. A pedra é um dos elementos mais importantes desse movimento, mas os artistas que dele participaram se permitiram também o uso de outros materiais, como o espelho, que vemos, por exemplo, no trabalho Phase of Nothingness (1969), de Nobuo Sekine. 

Constelação 20122005 é uma instalação de pedras coletadas no Rio das Cruzes, que nasce na Serra Mantiqueira e percorre toda a propriedade da Fazenda Santa Vitória. As pedras são cortadas ao meio e na superfície formada pelo corte é fixada uma placa reflexiva de inox polido. As pedras estão posicionadas seguindo coordenadas do mapa natal de Antonio (filho da artista já falecido). Como os monumentos pré-históricos em pedra, o trabalho faz referência à vida e à morte, a um certo jogo entre elas, mas também a uma diferença temporal entre a terra e o céu. 

Desde muito cedo, no início das civilizações mediterrâneas e do oriente médio, os homens antigos notaram, no céu noturno, o deslocamento de objetos móveis errantes (os planetas, a lua e o sol) sobre um fundo fixo que seriam as constelações formadas pelas estrelas e que os antigos chamaram de abóboda celeste. A posição dos objetos errantes nas constelações do zodíaco na hora de nascimento de uma pessoa definiria o retrato do céu no momento que um ser humano vem à vida na terra. É esse retrato que os astrólogos chamam de mapa natal ou mapa astral. A astrologia, que não se distinguia da astronomia nesse momento da história, seria a arte de ler o céu tentando entender, ao mesmo tempo, o que acontece na terra. 

Constelação 20122005 é, assim, um monumento que comemora o momento de nascimento de um ser e que, por esse gesto, o eterniza. Fala da transitoriedade da vida humana e da pedra como algo que eterniza essa transitoriedade. Essa educação pela pedra, poderíamos dizer, parafraseando o poeta João Cabral de Melo Neto, nos ensinaria algo sobre as relações entre o tempo e a vida. Como se as pedras representassem a temporalidade do céu na terra. O espelhamento das suas superfícies falaria desse encontro entre diferentes temporalidades que constituem a vida humana. Como disse certa vez Guimarães Rosa, as pessoas não morrem, ficam encantadas. O trabalho de Bia Monteiro traz para nós esse encantamento de volta. 

Cláudio Oliveira 

Curador 

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